Histórias de Dona Guiomar
escritas por Nereide S. Santa Rosa
Maio 04, 2001
Índice das Histórias já publicadas

Um pedacinho de nossos corações...

Desde o início do século XX, que vemos  São Paulo crescer...

Um cidade que parece destinada a aconchegar todos e tudo.

Uma cidade em que as oportunidades permitem às pessoas que alimentem seus sonhos e suas esperanças.. sejam eles quais forem.

Sucesso, poder, trabalho ou simplesmente ser feliz.

Uma cidade dinâmica que recebe e envia moradores para todo o país.   

Uma cidade que acomodou imigrantes de várias origens...italianos, japoneses, portugueses, árabes, judeus, chineses, espanhóis, uruguaios...

Acomodou os brasileiros dos mais variados rincões: dos sulistas ao nortistas. Nossa cidade sempre se permitiu ceder um espaço para quem busca novos caminhos e descobertas.

Muitos vem...

Outros vão...

Já tive a oportunidade de receber correspondências de muitos paulistanos que saíram de São Paulo em busca de outros lugares... Mas, sinto que eles aqui deixaram um pedacinho de seu coração...afinal, nossas raízes ficam  para sempre e, indelevelmente, anexadas a nossa vida... nosso passado transforma o presente e nos ensina o futuro...e quem parte leva seu passado dentro de si...mesmo que queira esquecê-lo...em certo momento, em algum suave momento de reflexão, as lembranças afloram ajudando-o a refletir os instantes de sua vida.

Muitos vão...

Outros vem...

Assim é São Paulo.

Muitos de seus filhos, mesmo de longe, se preocupam em melhorá-la.  

Uma cidade que vibra a cada segundo...seu povo é seu coração que canta, chora, xinga, vota, comenta, fofoca, viaja.

Tive o prazer de receber esta semana um texto de uma ex-moradora de São Paulo que agora vive em uma cidade do interior.

Pela beleza e pela sua preocupação com a cidade que nasceu, transcrevo a mensagem, devidamente autorizada.

Um mensagem que talvez nos faça pensar sobre a nossa cidade, os motivos de quem parte e de quem fica, uma reflexão a tantos de nós que, por tantas vezes, pensamos em  sair de São Paulo...ou para aqueles que  pensam em permanecer e participar, conviver e viver com qualidade e dignidade.

Dona Guiomar,
Por acaso entrei neste site.
Estava a procura de algo sobre os (alguns) pontos turísticos de S. Paulo
e encontrei este em um site de busca. Fiquei feliz em saber que a sintonia fina da Internet já chegou ao meu bairro de nascimento.
Nasci em 28/06/1970 e, na época, meus pais moravam na Jesuíno Arruda.
Depois mudei e mudei e mudei... até chegar aqui em Bauru, região central do Estado de S. Paulo. Depois de cursar História na UNESP de Assis, fiz
mestrado, também em História, sobre as várias representações que eram comuns às mulheres no início do século 20, em duas revistas do mesmo período.
Talvez a senhora possa ter tido contato com uma delas: A Cigarra. Ela nasceu paulistana, em 1914, depois foi comprada pelo Chateaubriand e foi p/ o Rio de Janeiro, na década de 30. Dou aulas hoje em uma faculdade e estava procurando algumas curiosidades sobre S. Paulo.
Encontrei! Um depoimento sensível e muito ligado afetivamente ao meu passado. As suas palavras sobre a desumanidade da cidade de São Paulo vão ao encontro com o meu modo de pensar sobre a nossa cidade, D. Guiomar. Pena que eu não consiga hoje imaginar um retorno sem medo, sem traumas, sem tristeza. Tenho dois filhos (um de 5 anos e outro de 1 ano e oito meses) e me acostumei aos ares interioranos, à humanidade e à comunidade que ainda se preserva nestas cidades. Temo pelos que pagam este preço que a senhora mencionou. Tenho irmãos, cunhadas e sobrinhos aí. Minha mãe, que agora mora comigo aqui, tem uma casa aí na Pedroso mas não pensa em voltar.
Hoje, 22 de abril muitos comemoram o descobrimento do Brasil. Mas se pensarmos bem, esse descobrimento(invasão) cheio dessa ânsia de progresso parece que levou ao caos à desolação e ao desespero dos "nativos". São Paulo acabou também por ser descoberta e ficou desabrigada. As levas de gente que aí se instalou (muito pela propaganda enganosa do lucro fácil tal qual meus antepassados imigrantes italianos em outros tempos e a todos os migrantes originários de todos os cantos do nosso País...) fez a cidade crescer, ficar alegre, múltipla, diversa mas essa mesma gente, que foi atrás de um sonho, acabou por ser impiedosamente abandonada pelas autoridades. Gostaria de comemorar um dia, o redescobrimento de S. Paulo.
Quero que um dia a nossa cidade possa chamar de volta todos aqueles filhos expulsos pela violência, pelo caos no trânsito, pelas desigualdades sociais, pelo barulho e desrespeito com a vida humana. Quem sabe este dia não esteja próximo. Se o progresso é via de mão única, poderíamos, pelo menos, não  transformá-lo em lobo do próprio progresso que engole a tudo e a todos. A modernidade não pode abandonar a memória à própria sorte.
Amei saber que existem pessoas que se preocupam com a memória histórica do bairro em que nasci em um pedaço da Internet.
Deixo os meus mais sinceros votos de felicidades à senhora e me desculpe pelas longas linhas.
Lílian Azevedo, Bauru/SP.

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