Histórias de Dona Guiomar
escritas por Nereide S. Santa Rosa
Setembro 28, 2001
Índice das Histórias já publicadas

Uma amiga especial

Mas que stress, não é mesmo?!

Nestes últimos meses nós, paulistanos, estamos vivendo um stress atrás do outro. Primeiro foi a crise energética que nos paralisou em diversas atividades atingindo tanto  as donas de casa como os grandes empresários, mudando nossos hábitos e nos fazendo ficar preocupados com o controle de consumo.

Depois vieram duas notícias violentas: a morte daqueles portugueses e logo em seguida, os seqüestros envolvendo o Silvio Santos. Foram noticiários que nos deixaram estupefatos e  serviram de comentários e reflexão para todos nós.

E agora, por ultimo, deparamos com as cenas dos ataques terroristas aos EUA e a possibilidade de guerra no mundo.

Eu me pergunto, como é que a gente agüenta tudo isso? 

Felizmente nesta semana tive um momento muito especial: conversei com minha amiga de infância Rosina Romeu. Recordamos momentos felizes que vivemos nas ruas ainda tranqüilas e bucólicas do velho Itaim-bibi. Recordamos que éramos garotas de sorte por termos ótimas famílias, por termos crescido educadas com valores morais e éticos. Recordamos os espaços de nossas brincadeiras  e de nossas festas juninas alegres e divertidas, agora perdidas no tempo e no espaço de nossas memórias. Recordamos as dificuldades de nossos familiares e a superação como objetivo de vida. Foi assim que,  nesse breve intervalo de tempo, nós nos deliciamos com nossas lembranças, nossas raízes e nossa vida. Amigas que, apesar de fisicamente longe, estamos tão emocionalmente perto.

Soube, para meu orgulho, que Rosina e suas filhas, lêem semanalmente esta coluna e que apreciam nossas histórias e comentários.

Foi então que lhe sugeri que escrevesse algumas palavras sobre a sua própria história que está relacionada com a história do Itaim-bibi, destacando a participação de sua família na construção de nosso bairro. Se a família Romeu não houvesse existido,  talvez o Itaim-bibi hoje não fosse o mesmo. Vocês vão saber por que. Transcrevo aqui as palavras de minha amiga Rosa: 

“Por volta de 1910, meu pai, Salvador Romeu imigrou da Itália, mais precisamente da Sicília, para o Brasil

Salvador Romeu na casa da Leopoldo

Salvador Romeu na casa da Leopoldo

Ao chegar, como tantos outros italianos, procurou por terras as quais pudesse desenvolver atividades agrícolas. E as encontrou na Chácara Itaim, que estava sendo loteada pelos donos da antiga fazenda, os Couto de Magalhães. Comprou um terreno de 6.300 metros quadrados pagando 400 réis o metro, localizado onde hoje se encontra parte do Hipermercado Extra. Nosso terreno ficava na Rua Leopoldo Couto Magalhães e se estendia  desde a altura da rua Urussui até a Rua Tapera (hoje Bandeira Paulista) fazendo divisa com a atual Av. Juscelino Kubsticheck onde existia o Córrego do Sapateiro que ficava  ao fundo de nossa chácara. Ela era toda rodeada de bambus. 

Rosina e sua família  Rosina e sua família 

Fotos desse local com Rosina e sua família 

A coragem de meu pai ao adquirir um espaço ainda tão rudimentar, coberto de mato, é demonstrada pela vontade que ele teve de progredir e o seu empenho em transformar o terreno em um local produtivo. E foi então que logo colocou mãos a obra. De sol a sol, trabalhava com afinco para construir nossa chácara. Com orgulho, a batizou de “Chácara das Bandeiras” como um marco de conquista, como nossos bandeirantes.

Foto na chácara em julho de 1972. 

Foto na chácara em julho de 1972. 

O primeiro espaço do terreno a ser organizado foi o pomar, onde plantávamos grande variedade de frutas e verduras. Lembro-me especialmente de algumas, como a pêra d’água e das parreiras carregadas de uvas, as quais possuíam um gosto inesquecível, tão especial como minhas lembranças. Um gosto que ainda procuro, mas não encontro mais, nem  mesmo que procure em todas as feiras. Um gosto misturado com a emoção de quem viveu e sentiu cada grão de terra, cada semente em suas mãos. O nosso pomar servia de fonte de alimentos para nossa família e também era o nosso rendimento visto que vendíamos nossas frutas e verduras no mercado. Dependíamos da terra. A mesma terra que hoje abriga centros comerciais e prédios de negócios. Terra que semeamos, regamos, aramos e cuidamos com carinho. Terra que nos dava a vida e o sustento. Eu, meu pai, minha mãe Ângela, meu irmão Paulo e minhas irmãs Josefina, Rosário, Felipa e Maria, fomos  os braços e as mãos que construíram esse pedaço do Itaim.    

Rosina e suas filhas - 1949

Rosina e suas filhas - 1949

Neste velho Itaim, de nossa infância e juventude, onde existia  muito trabalho e dedicação familiar. E quando havia oportunidade, um tempinho que sobrava nos finais de semana, nossa maior distração era ir ao circo que ficava na Rua Joaquim Floriano. Rosina Romeu, 20/09/2001.” 

Amiga Rosa, o tempo passa para todos nós e o que fica são estas boas lembranças e exemplos de vida. Uma vida de trabalho e de exemplo a todos nós, paulistanos, que sempre acreditamos no construir com nossas mãos e nosso suor, a nossa própria felicidade. Caros leitores, que o exemplo de vida e dedicação de minha amiga e de sua família frutifique em cada um dos jovens que hoje fazem parte de nossa cidade, pois  o trabalho enobrece e nos leva a caminhos de fraternidade e cidadania.Apesar de tudo, saibamos superar as dificuldades...

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