Histórias de Dona Guiomar
escritas por Nereide S. Santa Rosa
Outubro 13 de 2000
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Lembranças de viagem
Algumas das mais divertidas viagens que tive oportunidade de fazer na minha juventude, foram as inúmeras vezes que fomos a cidade de Aparecida do Norte. Na década de 40 , essas viagens eram constantes... Afinal, os automóveis eram a grande sensação do momento e programar passeios considerados como "distantes naquela época, era uma diversão que fazia parte de nosso cotidiano.
Hoje, lembro-me desses passeios com saudade e também com um pouco de admiração...acabo fazendo uma reflexão: após tantos anos, e outras viagens que fiz pelo Brasil e até mesmo para o exterior, como posso ter saudade de uma simples viagem a Aparecida do Norte? Concluo que, ter boas recordações de viagens não depende só do local visitado, mas sim dos momentos vivenciados. Momentos que ficaram inesquecíveis, seja pela companhia de pessoas queridas, seja pela nossas próprias descobertas que naturalmente acontecem quando estamos felizes.
No anos quarenta, Aparecida do Norte já era uma cidade procurada por turistas. As famílias de classe média começavam a ter transporte próprio, sem depender das linhas de trem para viajar. A abertura de estradas também favorecia o acesso as cidades fora da capital. Como por exemplo , a estrada que ligava Rio a São Paulo. Naquele tempo ela tinha uma pista só, era de terra e conhecida como BR-2. A história dessa estrada pode ser resumida da seguinte forma: Em 1724 foi decidida sua construção pela Província de São Paulo. A inauguração foi em 1928 pelo presidente Washington Luís, com extensão de 508 km, oito dos quais pavimentados. Em 14 de março de 1949 foi entregue a pavimentação do trecho entre São Miguel e Mogi das Cruzes e em 30 de abril passou a chamar-se Rodovia Presidente Dutra. Só em 1950 é que foi inaugurado um trecho com duas pistas. Nas décadas de 40 e 50, a construção de rodovias ganhou grande impulso devido aos impostos sobre combustíveis e a criação da Petrobrás, alem da implantação da indústria automobilística. Mas só no ano de 1951 é que o traçado da Rio -São Paulo foi retificado com encurtamento de 101 km e feita a pavimentação de dois terços Imaginem que nesse ano, o País tinha 262.529 automóveis e 210.244 caminhões e ônibus, num total de 472.772. Destes, o Rio de Janeiro ficava com 17.853 e São Paulo com 172.890.
Portanto, no ano de 1948, viajar a Aparecida do Norte era quase uma aventura. Na verdade levava-se quase cinco horas para irmos do Itaim-Bibi até lá, uma distância de 160 km ! Evidentemente o passeio era planejado com antecedência e intensa participação de todos. Digo todos pois em uma família italiana, como a do meu marido, todos significa todos mesmo!!! Cunhados, irmãos ,sobrinhos, no mínimo dez pessoas...todos moradores do Itahim antigo.
E o caminho? Como a estrada era de terra, a velocidade acabava sendo controlada e os buracos revelados...sacolejos para lá, sacolejos para cá, avançávamos em direção ao nosso destino. Geralmente, no caminho de ida parávamos em um posto de gasolina onde existia uma gruta de pedra com uma santinha. Lá aproveitávamos para almoçar e fazer outras necessidades...
E todos a bordo novamente . A perua seguia pela velha estrada...De vez em quando parávamos na beira da estrada para observar a paisagem. Imaginem que podíamos fazer isso tranqüilamente, não havia acostamento, mas também não haviam quase carros!!!!
Nesta foto nós estamos parados na estrada. Reparem no carro e na paisagem. Eu estou bem atrás do meu sobrinho Gilberto que está tomando um refrigerante, encostada na perua entre o meu cunhado José, meu irmão Alberto e sua esposa Lídia e Antonieta, esposa de José.
No caminho passávamos dentro de cidades como Mogi das Cruzes, São José dos Campos, Taubaté , Pindamonhangaba e finalmente Aparecida do Norte. E que emoção chegar lá...a fé que nos movia também nos comovia. Com respeito e devoção, visitávamos a igreja ainda pequena para os padrões atuais, e depois era a vez da capela dos milagres...existia pouco comércio em torno da igreja e ainda muito espaço pela cidade.
Cumprida a missão religiosa, o resto era se divertir...dar muitas risadas, brincar com as crianças. Nós adultos, ainda jovens, recém-casados, sentíamos a alegria de estarmos próximos. E estar juntos significava segurança e tranqüilidade... até mesmo os problemas ficavam diminuídos perante a convivência e a amizade entre os familiares.
Nesta foto, a frente da igreja, eu estou à direita, segurando uma bolsa, junto com o meu marido Nicola e todo o restante da família. Minha filha Neusa é a menina maior na fila da frente.
E então, na volta, uma parada era inevitável: a cidade de Jacareí e seus biscoitos.Que delícia ! Comprávamos as latas, grandes, azuis, cheínhas de biscoitos sortidos . Então, ao chegarmos em casa, exaustos, tínhamos o prazer de saborear essas delícias.Os biscoitos terminavam e as latas...ah, eram usadas para guardar condimentos, cereais, e outras coisinhas.
E logo novos planos começavam a ser traçados : novas aventuras pelas estradas precárias do velho Brasil. Aventuras que se transformariam em lembranças e saudades.
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